CÂMARA MUNICIPAL DE BOTICAS_Arq. Belém Lima
Jorge Alexandre Ramos Cavalheiro_49876
A proposta de prolongamento das instalações camarárias de Belém Lima vem questionar a forma como são hierarquizadas visualmente as cidades contemporâneas, que têm os centros comercias como equipamento mais importante. Desta forma, o projecto pretende dar resposta ao método como são representados os edifícios públicos associados ao poder.
O projecto insere-se num território esquecido, no pequeno núcleo urbano de Boticas, onde a edificação é morfologicamente homogénea. Neste sentido, a nova edificação assume-se claramente como diferente, não só da pré-existência como da envolvente. Este carácter é dado ao edifício através da sua morfologia, que contrasta com as restantes construções, dotando o edifico de uma certa irreverência.
A linguagem morfológica adoptada para as novas instalações tem um forte carácter escultórico, como se o edifício partisse de uma forma simples á qual foram retirados e adicionados volumes. Este desenho espacial pretende funcionar como uma nova imagem da cidade, afirmando Boticas como cidade, tanto á pequena escala, face á própria cidade, como á larga escala, perante outros centros urbanos próximos, como Chaves, Montalegre e Vila pouca de Aguiar, e longínquos, como Braga e Bragança.
A funcionalidade que o objecto adquire, não se restringe apenas a necessidades administrativas, mas também culturais. Neste sentido a utilização do objecto pretende funcionar como forma de afirmação de Boticas dos núcleos urbanos próximos, oferecendo um tipo de programa com pouca oferta na região, no entanto, a inserção deste tipo de programa acaba por não resultar devido á falta de aderência.
A zona de implantação localiza-se adjacente às antigas instalações que datam por volta dos anos 80, no lote anexo às mesmas, existindo uma relação de proximidade inerente, contudo, o novo objecto não procura uma continuidade linguística e espacial com a pré-existência.
As antigas instalações camarárias têm uma imagem austera e pesada, através da rigorosa delimitação dos limites do volume que as constitui, sendo este encerrado em si mesmo. Desta forma, a relação que a pré-existência estabelece com a praça adjacente é feita através de uma fachada espessa, com rasgos controlados, sendo clara a distinção entre espaço público de edifício público. O novo objecto assume-se claramente diferente da pré-existência, neste sentido a ligação que o edifício público estabelece com o espaço público é contínua, sendo esta ponte feita através do prolongamento da praça adjacente ao novo edifício, para o seu interior. A fachada que serve de entrada principal para a nova construção tem uma imagem dinâmica que, contrariamente às antigas instalações, extravasa os limites do volume simples que constitui o objecto, através da adição de peças mais pequenas que desconstroem as arestas do volume e o ornamentam, procurando uma continuidade de fachadas, principal e laterais, que são rematadas pela fachada traseira, mais controlada e pesada, que não tem o mesmo tipo de dialogo que as restantes.
A imagem provocadora que a nova construção adopta é transposta para a sua materialidade, que diverge das antigas instalações. Desta forma, o edifício é revestido com lajetas de mármore branco, que conferem ao novo objecto um brilho apelativo, que contracena com a tinta plástica branca das antigas instalações camarárias.
Este esforço que é feito para o novo edifício ter uma imagem diferente da pré-existência acaba por ser desnecessário, tendo em conta que o tipo de programa que o novo objecto abarca é por si excepcional, embora acabe por não ter aderência.
O diálogo que as antigas instalações camarárias e a nova edificação estabelecem entre si não é contínuo. O novo objecto pousa a sua fachada a uma cota superior, sendo a entrada para os diferentes edifícios feita a cotas diferentes, residindo a da nova construção a um nível mais elevado. Esta colocação do volume manifesta-se como uma reafirmação da sua imagem mais exuberante, divergente da pré-existência. Contudo, o novo objecto estabelece contacto directo com as antigas instalações camarárias, através de um passadiço interno, traduzindo-se formalmente, como uma peça elevado que se solta do volume geral. No entanto, este ponto de contacto não é assumido perante as diferentes praças adjacentes às edificações, situando-se num ponto relativamente central, em relação às fachadas principal e traseira da nova edificação.
O espaço interior da nova construção é marcado pelo pátio interior, que resulta do prolongamento da praça adjacente para o interior do edifício. No entanto, este prolongamento do espaço público, em que não existe diferenciação hierárquica da população, acaba por não ser tido em conta. Deste modo a cada piso corresponde um tipo de funcionalidade, que por sua vez, equivale a um nível de poder. O piso técnico encontra-se encastrado no terreno, suportando os restantes pisos, a ligação que este piso estabelece com o exterior é feita através da fachada traseira, mais simples e austera. A ligação que a área técnica estabelece com o piso de atendimento, á cota do pátio interno, é feita através de uma caixa de escadas, que liga num eixo vertical todos os pisos. No entanto, este acesso, reservado para funcionários, está oculto por um painel que remata a continuidade da praça exterior.
O vazio que recebe o utente no edifício, expõe a hierarquia e a forma como os restantes pisos se ligam, através do pé direito triplo que une os diferentes níveis. Desta forma, o piso de atendimento, que acolhe o utente, liga-se por uma extensa e lenta rampa, ao piso administrativo, com salão nobre e salas de reunião, o que torna este processo de distanciamento do espaço público demorado. Este piso remata, no pátio interior a ligação que o objecto estabelece com a pré-existência, no entanto, esta ligação não é lida pelos utentes do vazio interior.
Por fim, e de forma a culminar os diferentes níveis, está o piso politico, fragmentado por salas de pequena e media dimensão. Contudo, é no piso com maior distância do espaço público que o espaço interior vem á fachada, através de uma varanda voltada para a praça exterior, que comunica com os transeuntes, mas a um nível superior.
Em suma, a nova imagem que as novas instalações camarárias de Boticas exprime, procura resolver a hierarquia visual urbana, através de uma linguagem visual de vanguarda, contudo, a ligação entre passado e presente perde-se durante o processo de afirmação, fazendo com que a pré-existência viva á sombra do novo objecto.
Jorge Alexandre Ramos Cavalheiro
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